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Quem são os aliados do Desmatamento na Amazônia?

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3 de junho de 2019

Por André Lima-Correio Braziliense – 03/06/2019 –

Entre 2002 e 2012, o Brasil fez um grande esforço para enfrentar o que, naquele momento era o principal desafio ambiental brasileiro em escala global. O desmatamento, na Amazônia, na década de 90, chegou à média anual superior a 15 mil km2, atingindo pico em 1996 de 29 mil km2 num único ano.

O esforço do governo à época envolveu dezenas de ministérios em várias frentes simultâneas no âmbito do Plano de Prevenção e Controle dos Desmatamentos na Amazônia (PPCDAm). Dezenas de milhões de hectares de unidades de conservação criadas (parques e florestas nacionais e reservas extrativistas) e territórios indígenas demarcados na maior frente de desmatamento do país. Restrição de acesso a crédito público aos infratores reincidentes. Lista de municípios críticos, recadastramento fundiário e muito mais.

Tudo isso no mesmo período em que o PIB brasileiro cresceu de forma estável e sustentável, em média, 3,5% ao ano. Portanto, nem se fale que combate a desmatamento ilegal e crescimento econômico são fenômenos incompatíveis ou medidas antipatrióticas. A taxa chegou a menos de 5 mil km2 em 2012. Entre 2013 e 2018, viu-se um instável sobe e desce da taxa que flutuou entre 6 mil e 7,9 mil km2.

Preocupam sobremaneira os dados recentes de 2019, que indicam tendência de aumento significativo das taxas já no início de maio. Nos primeiros três meses, por serem de muita cobertura de nuvens, não foi possível detectar por satélite o retorno do desmatamento descontrolado. Dados da Plataforma Terrabrasilis, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), indicam que o desmatamento em um ano (junho 2018 / maio 2019) pode ter extrapolado os 10 mil km2. São cifras oficiais de uma instituição de renome internacional vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Em apenas 15 dias de maio, foram mais de 400 km2 detectados.

Ao se confirmar essa tendência, teremos, em 2019, pela primeira vez em 10 anos consecutivos, uma taxa de desmatamento na Amazônia tendente à média do fim do milênio passado, quando pouco era feito para controlar o fenômeno. De acordo com o Sistema de Alerta dos Desmatamentos (SAD), da organização Imazon, mais de 60% dos desmatamentos nos últimos três meses ocorreram em supostas propriedades rurais registradas no Cadastro Ambiental Rural (CAR) — sistema único no mundo que foi desenvolvido para monitorar e controlar o desmatamento ilegal nas propriedades rurais. O agronegócio brasileiro nos últimos anos promoveu road shows pela Europa e China apresentando o CAR como o maior programa ambiental do planeta, responsável pela redução dos desmatamentos no país, sobretudo na Amazônia.

O fato é que os discursos do presidente da República e do ministro do Meio Ambiente contrários às ações de fiscalização do Ibama e ICMBio já começam a dar resultado. Na esteira, veio a “nova” política. Mudança na legislação de infrações ambientais com uma instância a mais de “conciliação” em benefício de infratores. Corte orçamentário superior a 25% em ações de fiscalização e controle. Serviço Florestal migrando do Ministério do Meio Ambiente para o Ministério da Agricultura, sob o comando do deputado federal que historicamente mais lutou contra o próprio Código Florestal. Recorrentes alterações no Código Florestal (agora via MP 867) promovidas pela banda atrasada do agro no Congresso para ampliar anistias. Anúncio da revisão de processos de criação de 334 unidades de conservação (parques e reservas) em todo o país. Não é de estranhar que “os indicadores de desempenho e resultado” comecem a revelar o óbvio. Teremos em 2019 a maior taxa de desmatamento da década, provavelmente superior a 10 mil km2 e ascendente.

A longo prazo, a conta socioambiental será de todos os brasileiros com consequências danosas para o clima regional e global. Porém, do ponto de vista econômico, quem vai pagar é o agronegócio brasileiro, que investiu muito na melhoria da imagem nacional e, sobretudo, internacional. Vende uma imagem moderna e sustentável, mas não cumpre a promessa (já antiga) de acabar definitivamente com o desmatamento ilegal. Se você for um leitor atento e crítico, vai me perguntar: mas por que o agro será responsabilizado, se é o governo que está promovendo todo o desmanche?

Diferentemente dos governos Sarney, Itamar, FHC, Lula, Dilma e Temer, o agro hoje não é um aliado poderoso do governo Bolsonaro. É o governo Bolsonaro.

ANDRÉ LIMA
Coordenador do Projeto #RADAR, Instituto Democracia e Sustentabilidade, foi secretário do Meio Ambiente do DF